Saturday, March 19, 2005

“...porque os homens sempre serão maus se por uma necessidade não forem tornados bons.”
As coisas que se sabem desde há tanto tempo.

In “O príncipe”, Nicolau Maquiavel

Thursday, March 17, 2005

A chave do meu cérebro

Algumas teorias neurológicas atribuem a esquizofrenia, pelo menos em parte, à hipofunção cerebral, devido á interrupção da transmissão dopaminergica. Ou seja, quando os neurónio passam menos informação entre si. Discordo em absoluto. Concordo mais com a outra visão que atribui as alucinações ao aumento da actividade cerebral.E com conhecimento de causa.

Eu sou esquizofrénico sazonal. Não. A designação “sazonal” não é a melhor, mas digamos que quando bebo mais café e fico mais ansioso, mais alerta ao que me rodeia, começo a criar no meu cérebro tramas holiwoodescas (e não estabeleço qualquer relação causa/efeito entre a cafeína e a maior percepção da realidade). A cafeína excesso provoca um estado de ansiedade alucinada.

Estas tramas que no início são apenas devaneios, tornam-se cada vez mais densas, e por mais implausíveis que sejam eu assumo que se não aconteceu (apenas duvido porque me faltam provas concludentes), poderia muito bem ter acontecido. E sejamos francos, se algo pode acontecer, é como se fosse tão real com qualquer outra coisa. Falta de provas… pfui!! As pessoas inteligentes podem fazer o que querem sem ser apanhadas (eu que o diga). A falta de provas nunca provou nada. E qualquer sorriso, qualquer afirmação inocente, os olhares de esguelha no corredor, as frases sussurradas, tudo isso encaixa na minha trama. E sim, os humanos são cruéis, maliciosos, maquiavélicos. A única pessoa com quem sempre pude contar sou eu! Só eu me conheço! Eu sou o meu melhor amigo e só eu me posso fazer sofrer.

Mas o mais interessante acontece quando estou deitado, naquele estado de semi-inconsciência que antecede o sono. Começo a ouvir vozes. Elas são criadas pela minha imaginação, sei disso, e isso não é estranho. Mas agora imaginem que estão a ouvir rádio… podemos começar pela TSF… “o ministro justificou a medida com essencial ao progresso de país e a oposição contrapôs em uníssono que o equilíbrio orçamental e o progresso são coisas independentes”… agora aumentem o volume do rádio. Sim. Aumentem o volume do desse som que só existe na vossa cabeça. Aumentem até se tornar insuportável. E agora vão mudando de estação em estação… “se o meu amor me quiser, basta fazer-me um sinal…” “o médio lesionou-se no treino e antevê-se dificuldades no próximo embate da equipa…” “quero buzinar no meu calhambeque… Pipi… Pipi” “a situação no médio oriente degrada-se a cada dia que passa, e o roteiro de paz está mais uma vez em perigo…” tudo isto no vosso cérebro. As notícias, as musicas, os anúncios sucedem-se em catadupa na vossa cabeça, e vocês não conseguem parar, e nada disto é real, nada disto foi ouvido durante o dia, mas na minha cabeça tudo acontece com uma realidade impressionante. Eu tenho um controlador d volume de som no meu cérebro… e veio de série.

Há dias em que adormeço como um bebé. E sonho. Um dia acordei no meio de um sonho, e fiquei num estado de semi-inconsciência. Esse sonho, que não vou descrever, era apenas uma continuação das tramas urdidas no meu cérebro durante o dia. Acordei, e não quis voltar a adormecer. A antevisão do que sonharia em seguida fazia com que o meu coração se contrai-se, e uma mágoa imensa começou a afligir-me. Não queria voltar a adormecer, embora precisasse de descansar pois estava extenuado. Decerto que já vos aconteceu acordar, mas por algum tempo prolongarem semi-conscientemente os vossos sonhos. Muito agradável. É uma espécie de transição entre dois mundos. Um acordar perfeito, lento, cálido como o final de uma tarde de verão. Não muito agradável quando no sonho se reconstitui o pior dos vossos medos. Pior ainda se tiverem tendências masoquistas, se tornarem conscientemente o sonho pior do que estava ser. Não quis adormecer para não voltar ao sonho, mas ao ficar acordado o sonho tornou-se ainda mais nítido, juro que por momentos pensei que ele se materializou, e que tudo aconteceu naquilo a que chamamos realidade. Eu sou o melhor inimigo pois sou quem me conhece melhor.

“Lá estás tu com a mania que és esquizófrenico!”
“Isso é donça de rico e tu és pobre, pá! Tu és mas é louco! Esquizofrénico só porque ouves vozes na tua cabeça.”
“Nem louco ele é! Pensas que descrever as tuas supostas alucinações te vai tornar mais interessante?”
“E pesadelos!!! Come menos antes de te deitares. Ou pensas que és mais do que os outros?”
“bem-vindo de volta á mediocridade…”
“…de onde nunca saístes.”

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Ainda vem que me trouxeram de volta é terra. Julgar que era diferente dos outros só porque ouço vozes na minha cabeça e acho que sou o divertimento de todos os que me rodeiam, quando bebo demasiado café. Onde é que eu estava com a minha cabeça?

Poderia deixar de beber café, a causa de todos os meus males. Mas também gostaria de me sentir desejado.




Esquizofrenia (sintomas) - ideias delirantes, pensamentos irreais, "ideias individuais do doente que não são partilhadas por um grande grupo; as alucinações, percepções irreais"; ouvir, ver, saborear, cheirar ou sentir algo irreal, sendo mais frequente as alucinações auditivo-visuais; pensamento e discurso desorganizado, elaborar frases sem qualquer sentido ou inventar palavras; alterações do comportamento, ansiedade, impulsos, agressividade. Perda ou diminuição das capacidades mentais acompanham a evolução da doença e reflectem um estado deficitário ao nível da motivação, das emoções, do discurso, do pensamento e das relações interpessoais, como a falta de vontade ou de iniciativa; isolamento social; apatia; indiferença emocional; pobreza do pensamento. (fonte: wikipedia)
A Caverna (de Platão)
(co-autoria de Elyn)



Sinto-me com se estivesse numa jaula, numa gaiola... E quando encosto o meu rosto ás barras que me prende sinto o vento da liberdade que sopra lá fora, e me chama. E a vontade de sair apodera-se de mim como um desejo quase carnal, impaciente... A chave da gaiola está no centro da mesma, bastam-me uns passos e estender a mão...

Enquanto caminho observo a gaiola. Conheço todos os seus cantos. As fotografias na parede por mim penduradas. Aquela cadeira saída do meu labor. Nesta ambiente aconchegado sinto-me seguro. Há perigos, a vida aqui não é fácil, não sou objectivamente livre de fazer o que quero por mais que tente. Por mais poder que tenha nunca estarei no topo da hierarquia. Que perigos me espreitam lá fora? Os de cá dentro já os conheço, prevejo-os, sei como me esquivar, ou como sarar as feridas que eles que causam. Mas e lá fora? Terei liberdade! Mas sobreviverei tempo suficiente para dela usufruir?

Wednesday, March 09, 2005

Nature vs Nurture (2)

Aceito – não tenho mesmo outro remédio – que um Homem superior a mim por o que a Natureza lhe deu – o talento, a força, a energia; Não aceito que ele seja meu superior por qualidade postiças, com que não saiu do ventre da mãe, mas que lhe aconteceram por bambúrrio logo que ele apareceu cá fora – a riqueza, a posição social, a vida facilitada, etc.…

”O banqueiro anarquista”, Fernando Pessoa